La Cría

6 de nov. de 2024
Somos o tempo que temos
textos criados no GRUPO 01 do La Cría 2024
INTRODUÇÃO
Quando abro a janela, o vento sopra de um jeito tão suave que os pequenos cabelinhos da minha nuca dançam lentamente e avisam que o tempo está passando.
Suavemente doce.
Um cheiro de baunilha acompanha a brisa e segue sem endereço.
Mas enquanto o ar em movimento preenche meus pulmões, eu sinto medo que toda essa leveza se transforme novamente em um peso que não quero suportar outra vez.
De novo.
Eu sinto.
Como eu poderia ainda ser tudo aquilo que já passou?
Como eu posso ainda ser tudo aquilo que desejo ser?
Eu sinto.
Mas não sei.
Somos o tempo que temos passado.
Somos o tempo que temos à frente.
Somos o tempo que temos agora.
Somos o tempo que temos
porque sem o tempo não temos nada.
Violência contra a mulher na zona rural
cena trabalhada por Gabriele Dors
Para.
Para.
Para.
Para.
Para.
O passado é uma mentira bem contada que todo mundo acredita, menos eu.
Tô cansada de explicar.
Tô cansada de repetir.
Tô cansada.
Tô cansada.
Tô cansada.
Às vezes eu queria ser tudo aquilo que eu era antes de você.
Mas eu tô cansada.
E ninguém acredita.
Só eu.
Eu tô cansada.
Para.
Para.
Para.
Para.
Para.
O passado é uma mentira
Bem contada.
Todo mundo acredita,
menos eu.
O peso do passar do tempo
cena trabalhada por Pedro Diana
Começou de novo o tempo.
Começou.
Começou.
Começou.
Começou.
O tempo começou.
O tempo tá passando.
O tempo.
O tempo passa.
O tempo.
O tempo passa.
E agora eu já me esqueci.
Eu acho que a pior coisa que a gente pode lembrar que se esqueceu é esquecer…
Esquecer.
Esquecer.
Esquecer.
E quando a gente se esquece a gente se dá conta que o passado é uma mentira e se o passado é uma mentira como é que eu sei que eu tô falando a verdade?
Eu não sei.
Eu não sei.
Eu não sei.
Não tem como saber
Mas se o passado é uma mentira como que eu sei se sou o mesmo que fui há dois segundos atrás?
Eu não sei.
Eu não sei.
Eu não sei.
Como saber se a gente é a mesma pessoa de dois segundos atrás?
Como saber se a gente é a mesma pessoa de dois segundos atrás?
Como saber se a gente é a mesma pessoa de dois segundos atrás?
Eu não sei.
O tempo passa.
O tempo.
O tempo passa.
O tempo passa e de repente a gente já passa a ser esquecido.
isso é uma dor.
Porque a gente é esquecido.
Mas o tempo passa.
O tempo passa e a gente passa a ser esquecido.
E quando a gente é esquecido a gente deixa de existir.
Porque o tempo passa.
E passa.
E passa.
E passa.
Será que a gente já deixou de existir?
Medo do tempo terminar e a pressa violenta para ele acabar
cena trabalhada por Victória Leal
Deixa.
Deixa.
Deixa.
Deixa o dia ser só o que é para ser.
Porque a eternidade está em um segundo.
E quando eu vi já acabou.
E acabou.
E acabou de novo.
E acabou agora.
Acabou.
E agora acabou de novo.
Acabou.
Shhh…
Shhh….
Shhh….
Si
lên
cio
Shhh….
Acabou.
Quando eu vi já acabou.
Shhh….
Tic tac
Tic tac
Tic tac
Tic tac
Tic tac
A gente não sabe o quanto ainda vai ser seguro viver.
Tic tac
Tic tac
Tic tac
Tic tac
Tic tac
O tempo passou e a gente não sabe.
Deixa.
Deixa.
Deixa.
Deixa o tempo.
Deixa.
Deixa.
Deixa.
Dentro da cabeça
cena trabalhada por Luana Oliveira
Um grito no vazio.
Um grito ecoa no vazio e eu posso sentir dentro da minha cabeça.
Um grito.
Quem chama?
Quem está?
Livrai-nos do mal!
Um grito no vazio do pensamento e eu me sinto cada vez mais perdida.
Um grito.
Dois gritos.
Três gritos!
Quem chama?
No vazio.
No vazio.
Quem é capaz de escutar?
O que o grito diz no vazio é aquilo que talvez eu não consiga
ver
saber
perceber
compreender
repreender
ser.
Anda.
Vai.
Perdida.
Ando como um eco no vazio.
Talvez eu tenha medo.
Talvez eu tenha pressa.
Anda.
Alerta.
Livrai-nos do vazio de não conseguir escutar o próprio grito.
Envelhecimento feminino
cena trabalhada por Luana Rodrigues
Nem hialurônicos nem toxinas poderão sustentar a máscara que vai cair.
O envelhecimento feminino é imperdoável.
É somente o teu rosto invisível
que nem mesmo o tempo pode corroer.
Somente ele.
Só.
Olha para ele.
O que minhas rugas falam sobre você?
Ninguém passa ileso nessa vida!
O envelhecimento feminino é imperdoável.
E a máscara vai cair.
Isso é imperdoável.
O envelhecimento feminino é imperdoável.
Ninguém passa ileso.
Você não acha?
O que minhas rugas falam sobre você?
Ninguém passa ileso.
Ninguém.
E eu acho que tudo aquilo que minhas rugas falam sobre você é imperdoável.
Fôlego para continuar
cena trabalhada por Daniela Varotto
Fôlego.
Fôlego.
Fôlego.
Fôlego.
Fôlego.
Fôlego.
Fôlego.
Fôlego.
Fôlego para lembrar que ondas e lágrimas são feitas de água salgada.
Quando abro a janela o vento sopra de um jeito tão suave que os pequenos cabelinhos da minha nuca dançam lentamente e avisam que o tempo está passando.
Fôlego
Fôlego
Quem?
Quem tem olhos?
Quem?
Quem?
Quem tem olhos?
Quem tem olhos para ver o tempo soprando sulcos na pele da gente?